
Edição #18
Florença, 2025
Este é um livro essencial para os que querem entender como nasceu um dos estilos musicais mais importantes da música. Além disso, as histórias são hilárias... Ele não tem uma narrativa linear, são apenas muitos depoimentos de pessoas que viveram a cena na época. Selecionamos algumas das melhores partes e as juntamos abaixo. Mas não adicionamos nada que pudesse dar spoiler, como a parte que explica o nome do livro... De qualquer maneira, se você não leu o livro ainda, precisa ler! E se você já leu, relembre e se delicie com essas passagens do livro...

Ron Asheton: Fomos ver o The Who no Cavern. Estava completamente repleto de gente. Abrimos caminho à força até uns três metros do palco, e Townshend começou a estraçalhar a Rickenbacker de doze cordas. Foi minha primeira experiência de um pandemônio total. Era uma matilha humana tentando agarrar pedaços da guitarra de Townshend, e as pessoas lutavam para subir no palco, e ele brandia a guitarra na cabeça delas. A plateia não gritava, era mais como ruídos de animais uivando. O lugar inteiro ficou realmente primitivo – como um bando de animais mortos de fome que não comesse há uma semana e alguém jogasse um pedaço de carne. Fiquei com medo. Pra mim não foi divertido, mas mesmerizante. Foi tipo: “O avião está pegando fogo, o navio está afundando, então vamos rebentar um ao outro.” Nunca tinha visto pessoas ficarem tão enlouquecidas – a música levava as pessoas àqueles extremos perigosos. Foi quando me dei conta: “É exatamente isso que quero fazer”.
Ron Asheton: Iggy desceu as escadas em busca de algum conselho. Chegou pra mim e disse: “Bem, eu, eu acho que tem alguma coisa errada, talvez você possa me dizer o que é.” Daí tirou o pau pra fora, apertou, e apareceu um corrimento verde. Eu disse: “Meu chapa, você pegou gonorreia.” Nico passou pra Iggy a primeira gonorreia dele.
Alan Vega: "Aquele sujeito com franja loira – que parecia Brian Jones – apareceu no palco, e primeiro pensei que fosse uma mina. Ele usava um macacão de brim rasgado e uns mocassins ridículos. Tinha um ar selvagem – encarando a multidão e dizendo: “Vão se foder! Vão se foder!” Então os Stooges se atiraram numa das canções deles, e, quando se viu, Iggy estava mergulhando do palco pro chão e se cortando com uma guitarra quebrada. Não era teatral, era teatro. Alice Cooper era teatral, ele tinha todo o aparato, mas com Iggy não era encenação. Era a coisa real.
Iggy Pop: Quando a gente veio pra Nova York pra tocar no Ungano’s, fui ver Bill Harvey, o gerente geral da Elektra, e disse: “Provavelmente não vou conseguir fazer uma série de quatro shows sem drogas – drogas pesadas. Agora isso vai custar tanto, e devolvo a grana pra você depois...” Foi como uma proposta de negócio, certo? E ele ficou me olhando com uma cara de: “Não acredito nisso!” Mas pra mim era muito oficial e muito lógico, sabe como é: “O que há de errado nisto?”
Scott Kempner: Outros caras podem te dar um soco na boca, mas tem cura, só que Iggy estava me ferindo psiquicamente, pra sempre. Eu nunca mais poderia ser o mesmo depois dos primeiros vinte segundos daquela noite – e nunca mais fui.
Leee Childers: Acho que o fascínio de David Bowie por Iggy tinha a ver com Bowie querer penetrar na realidade rock & roll em que Iggy vivia – e que David Bowie jamais poderia viver porque era um estudantezinho insosso de arte da Zona Sul de Londres, e Iggy era da escória de Detroit. David Bowie sabia que nunca conseguiria captar a realidade na qual Iggy nascera. Então pensou que poderia comprá-la.
“DKANDLE tece paisagens sonoras transcendentes vibrantes e multicoloridas, misturando texturas Shoegaze difusas e reverberantes, meditações Dream Pop hipnotizantes, tons Grunge lamacentos e tensões Post-punk temperamentais, intensificadas com lirismo comovente e vocalizações emotivas e pensativas”
Jerry Nolan (New York Dolls): A gente teve as garotas mais bonitas. Eu dizia pra Johansen: “Jesus Cristo, David, a gente nunca conseguiria tocar uma garota como esta. Elas são lindas demais.” Mais tarde, na mesma noite, a gente estaria na cama com essas mesmas mulheres de pernas pro ar, olhando um pro outro e rindo. Uma vez nós dois estávamos transando com essas garotas e tocou “Looking for a Kiss” no rádio. Uau, ficamos maravilhados. A gente riu tanto que ficou de pau mole.
Ronnie Cutrone: O 82 Club era um antigo e famoso lugar de drags, onde Errol Flynn costumava tirar o pau pra fora e tocar piano com ele.
Mickey Leigh: Lembro de estar dirigindo pela Rua 53 com a Terceira Avenida e ver Dee Dee Ramone parado lá. Ele estava com uma jaqueta de motoqueiro, de couro preto, a mesma que usaria depois na capa do primeiro álbum. Estava simplesmente parado lá, então saquei o que ele estava fazendo, porque sabia que aquele era o ponto dos michês gays. Ainda assim eu ficava meio chocado ao ver alguém que eu conhecia circulando por ali, tipo: “Puta merda, olha só, é Doug fazendo ponto. Ele está mesmo nessa.”
Malcolm McLaren: Achei Richard Hell simplesmente incrível. De novo, eu acabava comprando a ideia de mais uma vítima da moda. Não se tratava de alguém vestido de vinil vermelho, com lábios cor de laranja berrante e saltos altos. Era um cara todo desmantelado, arrasado, parecendo que tinha recém-rastejado pra fora de um bueiro, parecendo que estava coberto de lodo, parecendo que não dormia há anos, parecendo que não se lavava há anos e parecendo que ninguém dava a mínima pra ele. E parecendo que na verdade ele não dava a mínima pra você! Era um cara maravilhoso, entediado, acabado, marcado, sujo, com uma camiseta rasgada. (…) Richard Hell foi definitivamente cem por cento inspiração, e, de fato, lembro de ter dito aos Sex Pistols: “Escrevam uma canção como ‘Blank Generation’, mas escrevam a sua própria versão arrasadora”, e a versão deles foi “Pretty Vacant”.
Dee Dee Ramone: Os Ramones sempre colocavam umas gotinhas de mijo em qualquer coisa que davam pros seus convidados, como uma brincadeirinha. Quando Johnny Rotten veio ver os Ramones na Roundhouse, perguntou pra Monte se podia ir ao camarim dar um alô. Johnny Ramone disse que tudo bem e foi muito cordial com Johnny Rotten quando se encontraram. Apertou a mão dele, deu uns tapinhas nas costas e perguntou se ele queria uma cervejinha. Ha, ha, ha. Johnny Rotten pegou e bebeu num trago. Nós todos ficamos prendendo a respiração, com a maior cara de pau. Então ele foi embora.
Dee Dee Ramone: Era verão, e em Londres não há ar-condicionado. Era num lugar chamado Country Cousin ou Country Club, onde todo mundo fazia suas festas. Estavam servindo vinho e cerveja, e todo mundo estava atrolhado. O banheiro inteiro estava cheio de vômito – na pia, nas privadas, no chão. Era completamente nojento. E alguém disse: “Dee Dee, você precisa de alguma coisa?” Eu disse: “Yeah, quero um pouco de speed.” De repente eu tinha uma enorme quantidade de speed na minha mão. Comecei a cheirar feito louco. Fiquei muito louco. E então vi Sid, e ele disse: “Você tem alguma coisa pra se chapar?” Eu disse: “Yeah, tenho speed .” Então Sid sacou um kit de apetrechos, botou um punhadão de speed na seringa e daí enfiou a agulha na privada, com todo o vômito e mijo, e encheu. Não pôs no fogo. Só sacudiu, enfiou no braço e saiu do ar. Fiquei só olhando pra ele. E eu que até ali achava que já tinha visto tudo. Ele olhou pra mim meio zonzo e disse: “Cara, onde você conseguiu essa coisa?”
Legs McNeil: Quando Joey voltou [de Londres], pelos olhos dele dava pra ver que tinha acontecido alguma coisa [no primeiro show dos Ramones em Londres]. Joey ficou dizendo: Legs, você não vai acreditar! Você não vai acreditar! Eles adoraram!” Não fiz ideia do que ele estava falando, porque naquele tempo punk ainda era só a revista, os Ramones, Richard Hell, Johnny Thunders, Patti Smtih e os Dictators. Havia só umas cem pessoas andando no CBGB’s. E metade dessas pessoas não eram punks, eram do mundo das artes, levadas ao Bowery pelas lamúrias yuppies de David Byrne. Os Dictators moravam no Bronx e dificilmente circulavam. E parecia que todo mundo, exceto eu e Joey, era junkie. Então punk, o movimento inteiro, parecia a nossa piadinha interna, destinada a ficar deste jeito.
Mary Harron: Dava pra sentir o mundo realmente se movendo e balançando naquele outono de 1976 em Londres. Senti que o que a gente tinha feito como piada em Nova York fora levado a sério na Inglaterra por uma plateia mais jovem e mais violenta. E que, de alguma forma, na tradução, aquilo tinha mudado, tinha acendido alguma coisa diferente. O que pra mim tinha sido uma cultura rock muito mais adulta, intelectual e boêmia em Nova York se tornara essa coisa louca adolescente na Inglaterra.
Malcom McLaren: Lá pelo começo dos anos setenta, a filosofia era de que você não podia fazer nada sem um monte de dinheiro. Então minha filosofia se voltou pra: “Foda-se, a gente não se importa se não sabe tocar e não tem instrumentos realmente bons, a gente ainda está fazendo porque acha que vocês são um bando de escrotos.” No fundo, acho que foi isto que criou a raiva – a raiva era simplesmente por causa do dinheiro, porque a cultura tinha se tornado corporativa, porque a gente não a possuía mais, e todo mundo estava desesperado pra tê-la de volta. Essa era uma geração tentando fazer isso. Estava tentando fazer com os Sex Pistols o que fracassara em fazer com os New York Dolls. Estava pegando as nuances de Richard Hell, a viadagem pop dos New York Dolls, a política do tédio e misturando tudo pra fazer uma afirmação, talvez a minha afirmação final. E irritar aquela cena rock & roll, era isso que eu estava fazendo.
Mary Harron: Na verdade não tínhamos nenhum motivo pra sermos idealistas, e eu estava farta da cultura hippie. As pessoas estavam tentando manter aqueles ideais de paz e amor, mas eles estavam muito desvalorizados. Além disso, era a época em que era bacana ser capitalista, e você não entrava mais naquela. Estava esgotado, mas, como os hippies defendiam o que era bom, ninguém podia deixar pra lá e dizer “isso acabou”. Era como se você fosse forçado a ser otimista, interessado e bom. E a acreditar em paz e amor. E, embora eu talvez acreditasse, me ressenti por todo mundo me dizer no que acreditar. Eu não gostava da cultura hippie, achava nauseante, afetada, sentimental e com carinha de smiley. Aí Richard Hell chegou e disse: “É isso que somos, somos a geração vazia. Acabou.”
Legs McNeil: O punk foi assim: isso é novo, isso é agora, apoteótico, poderoso. Mas não foi politizado. Quer dizer, talvez isto seja um lance político. O que quero dizer é que o grande lance do punk foi não ter nenhum compromisso político. Teve a ver com liberdade verdadeira, liberdade pessoal. Teve a ver também com fazer qualquer coisa que ofendesse um adulto. Ser simplesmente tão ofensivo quanto possível. O que pareceu delicioso, simplesmente euforizante. Ser quem a gente realmente era. Adorei aquilo, sabe?
Danny Fields: Quando os Sex Pistols terminaram em San Francisco, aquilo mostrou pra todo mundo que o lance punk não era viável. Que eles eram a fim de se autodestruir, e, desse modo, qual era o sentido de investir em qualquer um deles? (…) O rádio americano, naquela época como agora, não gosta de participar de nada que seja perigoso, revolucionário ou radical. Então a coisa toda se tornou um enorme monte de merda do qual ninguém queria se aproximar.
Legis McNeil: Depois dos Sex Pistols eu não estava interessado em fazer a revista Punk. Parecia mais uma armação da mídia. O punk não era mais nosso. Tinha se transformado em tudo que odiávamos. Parecia ter se tornado tudo contra o que a gente protestava quando lançou a revista.
Duncan Hannah: De repente o CBGB’s estava lotado. E quanto mais pessoas, mais clones, certo? Assim, o que antes era único, como James Chance, Anya Phillips e Richard Hell – subitamente havia vinte e cinco versões de cada um circulando por lá. Lembro que o punk saiu na Vogue, e quando aquela edição foi lançada vi Diana Vreeland no CBGB’s e todos aqueles turistas, certo?, visitando a favela – no Bowery.
Wayne Kramer: Eu disse: “Oi, Patti. Sou Wayne Kramer. Pensei em dar uma passada aqui e dar um alô e lhe agradecer por ter me citado no seu disco.” Ela meio que disse: “Oh”, e se catapultou pra longe de mim. Me senti como: “Ela não sabe quem sou. Não liga pra quem sou.” Daí percebi que pôr meu nome na contracapa do disco não tinha nada a ver com se solidarizar comigo ou manter meu nome na frente do público. Tinha a ver com emprestar credibilidade a ela. Era o alinhamento dela a mim, em vez de ser meu alinhamento a ela.
Eliot Kidd: Falei com Neon Leon no dia seguinte. Ele disse que, quando deixou Sid e Nancy, aquele porra daquele cara ainda estava lá. Eu disse: “Quem era aquele?” Ele disse: “Você sabe, aquele traficante de Tuinal.” Neon Leon me contou que todo mundo tinha ido embora, e o traficante de Tuinal foi a única pessoa que ficou. Tudo que a gente sabia sobre o cara era que ele morava em Hell’s Kitchen. Sid ficou na cadeia duas ou três semanas antes de sair sob fiança. Acho que Malcolm e os outros caras dos Sex Pistols fizeram uma vaquinha pra pagar a fiança dele. Falei com Sid no dia em que ele saiu da cadeia. Ele me contou que tudo de que se lembrava era que, quando acordou, foi ao banheiro – que é a primeira coisa que a maioria das pessoas faz quando acorda –, e Nancy estava embaixo da pia, com sangue por tudo, e ela estava morta. Acho que ele deixava a faca dele na parede. Sid tinha uma faca grande, e de manhã ela estava caída no chão perto de Nancy. Sid me contou que eles tinham oitenta paus. E a gaveta onde deixavam o dinheiro estava aberta, e o dinheiro não estava lá. Se você conhecesse Nancy, poderia vê-la indo ao banheiro, saindo, vendo o cara remexendo nas gavetas e o flagrando pegando o dinheiro – e indo pra cima do cara.
Wayne Kranmer: Ingerir drogas não requer muito talento, e acho que é por isso que nos rebaixamos até Sid, que, pode-se dizer, foi o produto máximo de todo o movimento punk.
Sugestão de leitura adicional: "Eu Dormi com Joey Ramone" - Mickey Leigh e Legs McNeil
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